A blogosfera educativa em Portugal

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Constata-se que os blogues já acompanham o processo de ensino nas escolas portuguesas, como reportam CARVALHO et al. (2008) e CRUZ et CARVALHO (2007), entre outros.
Tentou-se interpretar os motivos que levam os professores a construir blogues, colocando um breve questionário no InteraTIC, acessível em http://goo.gl/A00mm, uma rede de professores com mais de 2500 membros:  


Não se obteve qualquer resposta, porque para os escassíssimos professores que se assumem como autores de blogues disciplinares, estes são geralmente concebidos como um prolongamento virtual do seu espaço privado na sala de aula, embora fiquem acessíveis a visitantes inesperados, que muitas vezes nem encontrarão indicação da Escola a que pertencem. Acontece ainda que particularmente a antepenúltima pergunta era muito incómoda, pois para conseguir obter resposta a questões deste tipo são necessárias abordagens que não estão ao alcance deste trabalho.
Lamenta-se a falta de respostas ao questionário, mas prossegue-se o estudo com o material disponível na Web. Face à multiplicidade de experiências aí acessíveis, por questões metodológicas limitaremos a viagem á blogosfera educativa em Portugal utilizando apenas estudos estatísticos publicados por instituições, os recursos indicados pelo Ministério da Educação no Portal das Escolas e teses disponíveis no RCAAP.
Ana Carvalho (2008) analisou 48 artigos de autores portugueses publicados até ao final do 1º trimestre de 2008 sobre a temática da utilização educativa das ferramentas da Web 2.0.
Concluiu que a frequência com que se estudam os blogues está muito afastada de qualquer outra ferramenta, pelo que quando se fala em na resistência das escolas em adaptarem-se às novas tecnologias ou à Web 2.0 não será excessivo fazer a transposição para o contexto da blogosfera educativa.


Outra conclusão importante que pode tirar da sua pesquisa, admitindo que as ferramentas mais estudadas corresponderão às mais utilizadas, porque não faz
sentido estudar no vazio: a utilização de blogues será mais frequente no 2º + 3º
ciclos e no Ensino Superior que no Ensino Secundário.


O Conectivismo por si não explica esta disparidade no estudo/utilização de blogues por níveis de ensino. Porém compreendemos que até aos 10 anos (Jardim de Infância e 1º Ciclo) a utilização de blogues seja escassa porque os estudantes ainda estarão a aprender a ler e a escrever. No 2º + 3º ciclos, os blogues já serão adoptados como ferramenta que lhes permite a sua livre expressão e o desenvolvimento pleno da sua autonomia no Ensino Superior (justificação doméstica). No Ensino Secundário os blogues são suprimidos porque o quotidiano escolar é dominado pela lógica da “formatação” para exame, onde a “pedagogia” ideal consiste em recriar, durante todo o ano lectivo, condições semelhantes às que serão vividas naquelas escassas duas horas. É pena não dispormos de dados que isolem a utilização de blogues no Ensino Secundário, mas segundo CARDOSO et ESPANHA (2010:23) o nível etário entre os 15 e os 24 anos é exactamente aquele que mais frequentemente lê blogues, e no qual 32% dos cibernautas mantêm blogues, decrescendo esta percentagem acentuadamente a partir daqui (ibidem:16). Mesmo no ambiente da preparação para exames, cremos que se revelará vantajosa a criação de blogues de recursos pelos professores (justificação industrial).    
No início do 5º ano de escolaridade os alunos já possuem “os conhecimentos básicos sobre o manuseamento do computador uma vez que a amostra revelou ter tomado pela primeira vez contacto com esta tecnologia antes de entrar para a escola” (CRUZ et CARVALHO, 2007:41). O mesmo estudo desenvolve a justificação doméstica, concluindo que a experiência de utilização de blogues em turmas do 2º e do 3º ciclos “é bastante motivador para o aluno desempenhar tarefas a partir da Web” e que “o envolvimento e empenho dos alunos nas actividades proporcionadas pelos desafios lançados nos blogues, quer como recurso quer como estratégia pedagógica, possibilitou aos alunos o desenvolvimento e/ou consolidação de competências” (ibidem:84). Ao constituírem espaços de publicação na Web os blogues permitem tornar visível a produção escrita dos seus autores dando assim “voz” às suas ideias, interesses e pensamentos. Participar num blogue que tenha uma audiência pode ser um estímulo à reflexão e produção escrita desde que exista uma orientação e acompanhamento nesse sentido. A escola e as actividades nela realizada ficam mais expostas ao escrutínio público mas também mais próximas das comunidades em que se inserem e abrem-se novas oportunidades para o envolvimento e colaboração de diversos membros dessas comunidades. O médico do centro de saúde ou o farmacêutico da vila podem contribuir com os seus conhecimentos para o desenvolvimento de um blogue sobre educação para a saúde. Os pais de uma criança proveniente de outro país podem participar num blogue sobre tradições de Natal. As possibilidades são imensas (Gomes, 2005:313). O envolvimento da comunidade no processo educativo, facilitado pela rede, é um ingrediente da justificação doméstica.
Será oportuno referir que os professores não encararam os blogues com a mesma facilidade dos estudantes, pois “necessitavam de fazer alguma formação e auto-formação e aproveitar as reuniões semanais para experimentarem eles próprios a publicação no blogue. Ao mesmo tempo significava superar um desafio. A segunda dificuldade foi conseguir utilizar a sala de informática com alguma regularidade (…)” (Leão et Brandão, s/d:324).
É no miminho curioso o contraste entre a referência aos conhecimentos adquiridos pelos alunos do 5º ano de escolaridade, certamente em contacto com amigos e/ou familiares, num contexto doméstico, e as necessidades de formação referidas pelos professores, que remetem para a realização de acções de formação, segundo a lógica industrial. E mesmo depois de obtidos os créditos os blogues disciplinares não aparecem! Há certamente muito mais constrangimentos. Este contraste na perspectiva de  PRENSKY (2001 e 2004) sugere que a escola é palco do choque de culturas entre os nativos digitais e os imigrantes digitais
Conscientes das potencialidades das tecnologias verificaram-se realmente investimentos das autoridades em hardware, mas muito frequentemente sem terem em consideração os contextos locais. Esta será apenas mais uma explicação para que ainda que o acesso às novas tecnologias digitais nas escolas tenha aumentado significativamente nos últimos dez anos, sua adopção não se observou tão rápida e intensivamente quanto o esperado, apesar dos esforços políticos em promover e apoiar as inovações com base em tecnologia (OCDE, 2010).
A análise dos recursos indicados pelo Portal das Escolas sugere que o impacto deste “desfasamento” na blogosfera é selectivo, pois num total de 15 experiências relatadas, apenas uma se refere ao Ensino Secundário, predominando o 1º, 2º e 3º ciclos, mas estando também presentes os Jardins de Infância e o Ensino Superior.
Atendendo à especificidade dos diversos ramos do Ensino Secundário, as situações vividas no processo de ensino são susceptíveis de conduzir os professores a diferentes decisões. Veremos isso no ponto seguinte.

 

Written by José Neto. Powered by Novos Templates para o Blogger